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PEC da Blindagem estimula a corrupção
PEC da Blindagem estimula a corrupção

COMO A PEC DA BLINDAGEM ESTIMULA O BRASILEIRO A SER CORRUPTO

Ao exigir autorização dos colegas para investigar deputados e senadores, Congresso dá uma aula de como desprezar a lei

Escola de cinismo/Opinião

 

Entre as grandes bobagens já transformadas em sabedoria de botequim, nenhuma é tão confortável para os donos do poder quanto a ideia de que o político só rouba porque o brasileiro, no fundo, também rouba. Quer dizer: se a sociedade é corrupta, nada mais natural que seus representantes também sejam.

Balela. É o contrário.

 

Existe uma teoria antiga, vem lá de Platão e Aristóteles, que já foi confirmada por uma série de estudos ao redor do mundo — é a tese do mimetismo. Diz o seguinte: quando o ocupante de um cargo superior comporta-se de maneira imoral, seus subordinados sentem-se autorizados a fazer o mesmo. No Brasil, um país com míseras quatro décadas de democracia, não seria exagero dizer que os ocupantes de cargos superiores comportam-se de maneira imoral há 525 anos.

 

Aliás, vale lembrar que os dois maiores ídolos da política atual são frequentemente associados a bandalheiras. Mas desde os portugueses — que arrancavam as riquezas daqui e mandavam para longe —, atravessamos séculos de regimes arbitrários em que essa cultura extrativista, de obter vantagem em vez de construir, foi alimentando no brasileiro a sensação de que honestidade, quase sempre, é coisa de otário.

 

A indecência mais recente é a PEC da Blindagem. Ao exigir autorização dos coleguinhas para investigar deputados e senadores, o Congresso não está apenas tentando se proteger da Justiça. Está, mais uma vez, oferecendo uma aula ao país. A lição é clara: existe um regime para os comuns e outro para os figurões. A lei é igual para todos até a página dois — depois dela, o que vale é o crachá.

 

Ainda que fizesse sentido o argumento de que o Supremo persegue alguns, isso jamais justificaria dar salvo-conduto a 594 parlamentares cujo dever é prestar contas à lei. Isso não é defesa institucional, é licença para delinquir. E assim o brasileiro vai sendo treinado. Não aprende a desviar porque nasceu inclinado à malandragem: aprende porque olha para cima e vê que o jogo funciona assim.

 

Se os deputados podem escolher quando serão investigados, por que ele não escolheria quando pagar imposto? Se os senadores podem blindar uns aos outros, por que ele não se blindaria com um atestado falso? Depois dizem que o brasileiro é corrupto por natureza — se fosse, não precisaria de tantos mestres. A cada espetáculo de cinismo em Brasília, o país inteiro entende a cartilha: a lei é para os outros.

 

Fonte:  Zero Hora/Paulo Germano em 18/09/2025